Research

11.03.2011

Baile de Carnaval



Viera ao baile só porque sabia que ela também estaria ali. Entre serpentinas, confetes e máscaras, estava atento apenas aos topos das cabeças que passavam, estava escuro, mas seu coração dava um salto a cada vez que identificava um reflexo avermelhado nos cabelos de uma bailarina ou marinheira. Mas não, cada vez que uma delas se virava ele não encontrava aquele olhar, o olhar que conhecia tão bem, ainda se lembrava da primeira vez....

Havia acabado de chegar de Lima, cansado e maluco por um chocolate, entrara na primeira loja para comprar uma barrinha. Naquela ansiedade, pegou o primeiro que apareceu pela frente e correu para o caixa, onde viu aqueles cabelos ruivos pela primeira vez. Nesse momento seu celular tocou, uma música peruana esquisita que um dos amigos que fizera na viagem havia insistido para passar para seu telefone.

Foi aí que ela olhou para trás, com aqueles olhos castanhos, sarcásticos, e levantou uma das sobrancelhas. Riu sem graça, o estrago já estava feito, o que uma mulher como aquela iria querer com alguém como ele, com barba por fazer há três dias, cabelo sem corte e camisa grossa de flanela usada desde a última expedição para conhecer a periferia ao redor de Lima?

Ao ver seu constrangimento ela riu, mostrando os dentes separados, mais um charme hipnotizador. Tantas características marcantes em uma mulher, que separadas poderiam ser estranhas, mas em conjunto formavam um charme indescritível. O que não sabia é que a barba e o espírito aventureiro que emanava com aquele visual de viajante a conquistou, sem nenhum dos dois saber o porquê, seguiram na mesma direção e acabaram dividindo um táxi.

O táxi – coincidência? – tinha o mesmo hotel como destino. Talvez a descida ao bar no mesmo horário não tenha sido uma coincidência também, mas funcionou perfeitamente. Foi apenas um final de sábado e um domingo inteiro, seguido por uma semana de trabalho intenso. Reuniões na sede da revista para ele e ensaios exaustivos para ela.

Após empacotar todas as lentes, cartões de memória e baterias, saiu do hotel sem vê-la. Não resistiu e passou no teatro, antes de ir ao aeroporto. Trocou algumas palavras com o segurança, que por sorte (ou seria coincidência novamente?) tinha vindo do Peru para trabalhar em Nova York e o deixou entrar. Não queria atrapalhar, então assistiu da porta a coreografia que ela executava tão bem. Com um sorriso no rosto, foi embora. Era hora de pegar o próximo voo.

E agora, cinco anos depois e uma série de desencontros ali estava, parado, com a visão já levemente embaçada e procurando aquele sorriso, aquele olhar, aquele cheiro e aquele sentimento único. Enquanto olhava o gelo derreter no copo devaneava sobre os desencontros e a ironia dos tempos modernos. Viagens por todo o mundo os tinham separado e agora, num clube de Porto Alegre as chances de se encontrar eram maiores do que nunca. Teria que partir novamente, desta vez para a África do Sul, enquanto ela seguiria com a turnê do espetáculo novo para Londres em duas semanas.

Em meio a tantos pensamentos sentiu o coração acelerar sem motivos. Não precisou virar o rosto ao sentir o toque em seu ombro para saber que era ela. Os cabelos avermelhados estavam presos em um coque, enfeitado de penas. Que dúvida! Ela tinha vindo como bailarina e o reconhecido de longe pela fantasia de paparazzi – claro que ele faria uma piada com a própria profissão.

Ao olhar para aquela sobrancelha erguida não pode evitar o sorriso se abrindo e os olhos fechando prevendo o encontro dos lábios que estava prestes a acontecer. Seria apenas uma noite, ou no máximo um final de semana até o próximo encontro – que poderia acontecer em três meses ou 10 anos, mas sempre seria muito mais do que especial.

Um comentário:

  1. Já lhe disse que adoro seu estilo.
    Insisto para que explore, desnude, mais, a sua verve autoral.
    Gostei muito!
    Espero, no futuro, algo mais visceral.
    Parabéns!
    PS: Já leu Jostein Gaarder, além do super conhecido Mundo de Sofia?

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